O "Movimento Literário Kuphaluxa", realizou na última quarta-feira,
no Centro Cultural Brasil-Moçambique em Maputo, uma palestra proferida
pela escritora Lília Momplé, no âmbito do projecto "encontro com um
escritor", que visa abrir espaço de interação entre escritores e
literatas, seus seguidores e amantes da literatura em geral.
Pretende-se com esta iniciativa, promover a Literatura Moçambicana no seio da juventude e divulgar e valorizar as obras dos escritores moçambicanos.
Num artigo escrito pelo nosso correspondente e membro do nosso Conselho Editorial/Redatorial, Eduardo Quive, representante do Movimento Literário Kuphaluxa" de Moçambique, entidade parceira do nosso Blog-Revista Culturas e Afetos Lusóflturas, está
resumidamente exposta o conteúdo da conversa, com a breve discrição da
vida da escritora.
Texto escrito e editado por Eduardo Quive
Resumo de uma conversa entre a escritora
Lília Momplé e
jovens amantes de Literatura em Maputo
Contemporânea dos remotos
tempos da dominação colonial portuguesa nas terras moçambicanas e voltada dos
horizontes do mundo fora, a escritora moçambicana Lília Momplé, encontrou-se
com amantes da literatura para falar de si, da sua obra e do protagonismo em
que expande a sua escrita nos leitores. Lília Momplé fora voz do nacionalismo,
mas hoje, aos 76 anos de vida, é a palavra que se exalta na nova consciência e
inspira as novas gerações. Mas não abandonou o seu nacionalismo literário. Na
conversa promovida pelo Movimento Literário Kuphaluxa, na última quarta-feira em
Maputo, a escritora brincou com as palavras e educou os literatos novatos,
afinal de contas Lília, fora também professora.
De nome completo
Lília Maria Clara Carriére Momplé, natural da Ilha de Moçambique, esta mulher
que escreve o que lhe vai na alma, inspira os jovens e nas suas obras, revela
os mistérios da sua força nacionalista e pela justiça social.
Há quem diga que
cada escrito da Lília Momplé, é uma denúncia, mas a escritora prefere dizer que
é um momento de desabafo, revelação, confidências e só o faz quando não aguenta
mais se calar.
Em seguida o teor da sua conversa com
jovens em um breve resumo:
“Há uma necessitada
de se fazer valer a literatura oral. Esta forma literária é riquíssima e corre
o risco de se esquecer.
Com a
literatura, há oportunidade de se criar riqueza. A literatura é a base para o
conhecimento e criação, e num país onde há criação, já sabemos que se pode
alcançar o desenvolvimento.
Como é que surge a vontade de escrever?
Quanto ao ser
escritora, sempre sobe que um dia ia escrever, só não sabia quando. O gosto
pela literatura herdei da minha avó. Ela era Macua e habitualmente contava-nos
estórias lindas da tradição em volta da fogueira. Nesse momento eu dia para
mim, «um dia vou escrever estas estórias».
E ouve um outro
acontecimento que significou muito para mim: aos 13 anos, estudei no Liceu Luís
Salazar, uma escola que era apenas para brancos e pessoas com as melhores
condições. Eu era a única negra e minha mãe teve que fazer muito sacrifício
para que eu estudasse lá. Ela passava noites a costurar para poder pagar a
minha escola, foi uma fase muito difícil. Foi mesmo um acto heróico estudar lá.
Tive um
professor de que o nome não posso me esquecer: o seu nome é Rodrigues Pinto,
era professor de língua portuguesa. Mandou-nos fazer uma redacção sobre o
último de dia de férias.
Feita a redacção
e chegada a hora de entrega dos trabalhos depois de avaliadas, ele foi chamando
cada aluno para buscar o seu trabalho e o meu foi último. Confesso que fiquei
com medo quando não chamaram-me. Quando terminou a entrega aos outros ele disse
chamou-me e disse que o meu trabalho foi magnífico. E dali, ele passou a ler a redacção
em, toda escola. Fiquei muito orgulhosa. Toda escola apontava no pátio por ter
feito o melhor trabalho. Isso marcou-me muito e cada vez mais acreditava que um
dia ia escrever.
E porque escreve?
Escrevo porque
me sinto honrada!
Escrevo pelo
desejo de contar e de descarregar os meus segredos.
E o primeiro livro… “Ninguém Matou Suhura”,
como é que surge?
Escrevi o primeiro
livro porque tinha uma carga muito grande sobre o colonialismo em Moçambique. Eu
tinha raiva do colonialismo. Muita raiva. Tinha a raiva da injustiça. Eu nunca
me conformava por tudo que via: massacres sofrimento, opressão isso incomodava-me.
Mesmo quando
casei-me, embora com um branco, ele porque também não suportava ver a injustiça
disse que tínhamos que sair do país. Foi assim que acabei vivendo no Brasil por
muito tempo.
Escrevi o Ninguém
Matou Suhura porque eu queria conversar com alguém sobre o que vi e vivi
durante aquele tempo. Tinha que me revelar.
As outras obras «Os olhos da Cobra Verde» e
um Romance, intitulado «Neighbours» não fogem muito de quem caracterizou a
primeira…
O segundo livro
também se baseou em factos reais. Da morte de uma amiga que era muito boa
gente. Ela tinha muita vida, se não mesmo ela era a própria vida. Isso foi
muito doloroso e marcou-me. Eu tinha que escrever. O terceiro também foi mais
uma revelação.
Vivemos
uma sociedade de negócios o “Business Society”, onde o que vale é o medíocre e
não desenvolvimento.
Tem em vista mais uma obra?
Estou a preparar
mais um livro, talvez seja o último. Ele vai retrar o que chamo de “Busniss
Society” (sociedade de negócios). O título poderá ser “Fantoches de Aços”.
Nesta obra vai sair
muitas verdades. É mais uma revelação de algo que me vai na alma, sobre os dias
que vivemos. Onde as pessoas são insensíveis pelos negócios. Tudo eles fazem
pelo dinheiro. Pobres que sofrem e só discursos políticos vazios. Só para fazer
negócios. É o Busness Society a que me refiro. Essa sociedade não é a
verdadeira moçambicanidade, isso nos tira a identidade e aconselho-vos a sair
dela.
São Fantoches
porque são; e são de Aço porque não tem piedade.
No Busness
Society o que vale é o medíocre e não o desenvolvimento.
Como é que se define Lília Momplé?
Essa é uma
pergunta muito difícil. Acho que não sei me definir, mas vou tentar. Penso que
sou uma pessoa coerente, que, por exemplo, não se pode adaptar ao Busness
Society. Porque não suporto injustiça. Sou coerente.
A caminho dos 80 e com percursos brilhantes
na sua vida literária, pensa ainda em fazer alguma coisa na literatura, para
além do livro que vai lançar em breve?
Essa também é
muito difícil de responder. Engraçado que nunca pensei nisso. Sinceramente que
não.
Mas é assim…Não
escrevo porque quer fazer alguma coisa na literatura, aliás eu nunca quis fazer
nada na literatura.
Quando não tenho
nada para dizer não escrevo.
Então não quero
fazer nada na literatura, por isso não falta nada para fazer.
Eu escrevo
porque tenho que escrever.
Qual é o segredo que quer deixar para uma
nova geração de escritores?
Que amem a
literatura antes de querer ser escritor, porque só assim poderão ser os
verdadeiros escritores. Eu não acredito em quem quer ser escritor, pois
escrever tem que ser por força de alguma coisa. Uma emoção forte. Você é um
enviado especial de algum sentimento. Mas se os jovens amarem a literatura,
farão algo por ela e nessa convivência, podem ser escritores e bons escritores.
Que sinceramente o nosso Moçambique precisa.
Tem mais alguma coisa a dizer?
Quero agradecer
a oportunidade que o vosso movimento (Movimento Literário Kuphaluxa) me deu de
estar aqui em conversa com os jovens e devo dizer que vos admiro. Realmente
vocês são amantes da literatura e esta conversa que aqui tivemos é muito
significativa para mim. Já passei por mais de 20 países para falar da
literatura de mim e das minhas obras, mas a emoção que estar a falar com os
verdadeiros mensageiros da literatura e que são jovens muito novos do meu país,
que mostram o verdadeiro interesse pelas artes, isso me deixa muito feliz.
Obrigado Kuphaluxa.
E mais… se
querem realmente crescer nesta área, leiam. Leiam muito. Assim o podem ser de
facto uma nova geração de escritores e eu tenho fé, que daqui a mais quatro
anos ou menos. Um de vocês vai aparecer no sucesso e lembrar-se das minhas
palavras.
Continuem assim.
Convidem mais escritores para estes encontros, que não seja apenas a Lília
Momplé, os jovens precisam destes momentos e eu sempre estarei ao vosso dispor,
para qualquer momento destes e outros.
Breve biografia
Lília Maria Clara Carriére Momplé, nascida a 19 de Março de 1935 na Ilha de Moçambique, província de Nampula, a norte de Moçambique, é Assistente Social de profissão, com licenciatura em Serviços Sociais.
Lília Momplé,
foi professora de Inglês e Língua Portuguesa na Escola Secundária de Ilha de
Moçambique e directora da mesma escola entre 1970 e 1981.
Trabalhou como
assistente social em Lisboa, Lourenço Marques (actual cidade de Maputo) e em São Paulo, Brasil, em 1960 a 1970.
Em outras
missões, Lília Momplé foi, de 1992
a 1998, directora do Fundo para o Desenvolvimento
Artístico e Cultural de Moçambique (FUNDAC) e de 2001 a 2005, membro do
Conselho Executivo da UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação,
Ciência e Cultura.
No seu percurso
literário, dirigiu a Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO) de 1991 a 2001, como secretária
geral, de seguida ficou presidente da Mesa da Assembleia-geral da mesma
agremiação.
O seu primeiro
livro veio ao público em 1988, editado pela AEMO, com o título «Ninguém Matou
Suhura», uma colectânea de Contos; «Neighbours» romance publicado em 1995 e «Os
Olhos da Cobra Verde» obra de contos publicada em 1997, também sob a chancela
da AEMO.
Ainda na arte, a
escritora publicou o «Muhipiti-Alima» um vídeo de drama, editado pela PROMARTE
em 1997.
As obras da
Lília Momplé, já foram editadas em Inglês, Italiano, Francês e Alemão.
Neste momento, a
escritora faz parte do «Internacional Who´s Who of Authores and Writeres» e
desde 1997 é membro de «Honorary Fellow in Literature» da universidade IOWA dos
Estados Unidos da América (EUA).
Prémios
Em termos de
prémios, Lília Momplé, conquistou o primeiro prémio do concurso literário
comemorativo da cidade Maputo, intitulado Prémio 10 de Novembro com o conto
«Caniço» em 1987.
Melhor
vídeo-drama moçambicano em 1998, com o vídeo «Muhipiti-Alima».
Foi nomeada o
Caine Prize for Africaan Writing, edição de 2001. fez parte dos cinco nomeados
entre 120 escritores de 28 países.
NOTA: Este foi o resumo da conversa que jovens amantes
da literatura tiveram com a escritora Lília Momplé, na galeria do Centro
Cultural Brasil – Moçambique em Maputo e não se trata de uma entrevista
conduzida por uma pessoa.
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