TOP BLOG 2010

TOP BLOG 2010

Boas Vindas a esta comunidade de Culturas e Afetos Lusofonos que já abraça 76 países

MÚSICA DE FUNDO E AUDIÇÃO DE VÍDEOS E AUDIOS PUBLICADOS

NÓS TEMOS TODO O EMPENHO EM MANTER SEMPRE MÚSICA DE FUNDO MUITO SELECIONADA, SUAVE, AGRADÁVEL, MELODIOSA, QUE OUVIDA DIRETAMENTE DO SEU COMPUTADOR QUANDO ABRE UMA POSTAGEM OU OUVIDA ATRAVÉS DE ALTI-FALANTES OU AUSCULTADORES, LHE PROPORCIONA UMA EXPERIÊNCIA MUITO AGRADÁVEL E RELAXANTE QUANDO FAZ A LEITURA DAS NOSSAS PUBLICAÇÕES.

TODAVIA, SEMPRE QUE NAS NOSSAS POSTAGENS ESTIVEREM INCLUÍDOS AUDIOS E VÍDEOS FALADOS E/OU MUSICADOS, RECOMENDAMOS QUE DESLIGUE A MÚSICA AMBIENTE CLICANDO EM CIMA DO BOTÃO DE PARAGEM DA JANELA "MÚSICA - ESPÍRITO DA ARTE", QUE SE ENCONTRA DO LADO DIREITO, LOGO POR BAIXO DA PRIMEIRA CAIXA COM O MAPA DOS PAISES DOS NOSSOS LEITORES AO REDOR DO MUNDO.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

POETA CARLOS MORAIS DOS SANTOS ESCREVE TRIBUTO DE HOMENGEM A FERNANDO PESSOA


CICLO TRIBUTO AOS POETAS LUSÓFONOS


TRIBUTO A FERNANDO PESSOA


UM DOS MAIORES GÉNIOS DA POESIA LUSÓFONA

Hoje, decidi trazer a este CICLO DE TRIBUTO AOS POETAS LUSÓFONOS, aquele poeta que é a minha maior referência poética, o meu Grão Mestre, desde a infância, e que há muito considero ser o maior poeta da língua portuguesa depois de Camões e um dos maiores poetas mundiais do século XX. 

Fernando Pessoa e a sua Obra, são, provavelmente, objecto de um dos mais selecionados temas para teses de Doutoramento nas Unniversidades do Mundo inteiro, cabendo ao Brasil, aos EUA e à França, porventura os três primeiros lugares neste Podium de Teses de investigação literária sobre a obra do Poeta.

Esta publicação (postagem) será, porventura, a maior de todas as que já dedicámos ou venhamos a dedicar a qualquer poeta, mas o gigantismo da obra e do autor ficam, ainda assim, muito acanhados neste modesto espaço. 

Sendo este Blog, uma Revista de Cultura de edição semanal, e considerando os minutos que são precisos para "bebermos" vagarosamente o néctar da belíssima poesia de Fernando Pessoa, aqui servida em tragos, como convém a um bebida preciosa, convido, pois, os nossos leitores a lerem o texto, os poemas e a ouvirem os vídeos desta publicação, degustando aos poucos durante a semana, calmamente, ao som suave da música relaxante de Chopin, Mozart, Sati, Ravel ou de Zanfir, que se ouvem como fundo musical. Sugiro que ligue o som baixinho e se recoste confortavelmente com espírito e mente livre. Ao chegar ao momento de audição dos vídeos, é conveniente parar a música de fundo acionando o stop do comando que se encontra no  início  da página, na primeira "caixa" da coluna de "caixas" da direita. Estou certo, que experimentará um momento muito recompensador.

Apesar de me considerar um operário artesão da escrita, confesso que, hoje, aqui e agora, só de começar a escrever sobre Fernando Pessoa, as emoções  me tomam e sinto, de começo, as mãos hesitantes sobre o teclado,  por sentir que, sem "licença especial" para penetrar no Parnaso dos poetas do Olimpo, estou "ousando profanar" o nome do grande génio e da sua obra, eu , "poeta em construção", desde os 14 anos, que só persisto nesta empresa, embora pequena e modesta, para a qual não me atribuo qualquer autoridade, porque a intensidade da grande veneração que nutro pela obra gigantesca e genial do Grande Mestre, me dá a força, o ímpeto atrevido e a coragem para prosseguir. 

Deixarei a outros académicos, grandes  especialistas e autoridades que se engajaram como investigadores durante parte de suas vidas sobre os estudos Pessoanos, a "Galeria de Honra" de especialistas da obra de Pessoa, esperando que me absolvam da minha ousadia, mitigada, no entanto, também por eu desde menino me ter envolvido com a sedução da poesia de Pessoa, desde os tempos em que, a meio da minha instrução primária, com os meus 9 anos, já era instado pela minha Professora a "recitar", empolgado, para a classe de coleguinhas entusiastas, entre outros poemas "O Mostrengo" para júbilo de nossa querida Dona Berta, minha magnífica professora, que também me iniciou no teatro - que mais  tarde viria a ser uma das minhas  paixões, quase opções de vida - quando me incluía sempre nas representações, aos sábados, do teatro Vicentino. 

Limitar-me-ei, portanto a algumas notas biográficas e a pequenas considerações, sem pretender que este escrito seja considerado, sequer um pequeno ensaio, objectivo outro a que um dia penso me dedicar. 

Fernando António Nogueira Pessoa nasceu em Lisboa, a 13 de Junho de 1888 e faleceu em Lisboa em 30 de Novembro de 1935, 16 dias depois do meu nascimento. 

Ah, como eu gostava de o ter conhecido ! Não aos meus 16 dias, claro, mas aos meus 16 anos, se ele tivesse "partido" mais tarde quando eu já estava  enamorado da sua poesia e a debutar escrevendo a minha! Infelizmente, não esperou por mim !  

Segundo ele próprio nos narra, no ano seguinte ao seu nascimento, veio ao mundo Alberto Caeiro, o poeta do campo e da natureza e também Álvaro de Campos, o engenheiro.
Quando tinha cerca de 5 anos, seu pai morre com apenas 43 anos.

Em 1894, então com 6 anos de idade, cria seu primeiro heterónimo: Chevalier de Pas.

Em 1896, parte com sua família para Durban, África do Sul.

Vão morar com o novo marido de sua mãe, o comandante João Miguel Rosa, cônsul interino de Portugal naquele país. 

Na África do Sul, Fernando Pessoa vai aprender inglês e francês, línguas em que escreverá alguns poemas e grandes trabalhos de tradução.

Com 14 anos de idade, em 1902, escreve o poema "Quando ela passa".

Por ter sido educado na África do Sul, para onde se mudou aos sete anos em virtude do casamento de sua mãe, Pessoa foi alfabetizado em Inglês. Das quatro obras que publicou em vida, três são na língua inglesa. 

Fernando Pessoa é justamente considerado um dos mais geniais poetas da Língua Portuguesa de todos os tempos. O seu valor é comparado ao de Camões.  O famoso e mundialmente prestiigiado crítico literário Harold Bloom considerou a sua obra um "legado da língua portuguesa ao mundo".

Durante a sua discreta vida, actuou no jornalismo, na publicidade e como empregado de um escritório comercial, onde desempenhava as funções de escriturário-guarda-livros-correspondente de línguas estrangeiras (inglês e francês) num escritório de transitários da Baixa Lisboeta.

No âmbito desta sua área profissional, é notável o facto de ter sido Director da primeira "Revista de Comércio e Contabilidade", cujo primeiro número - que eu tenho a sorte de possuir um exemplar - saiu em Janeiro de 1929. Nesta Revista, Fernando Pessoa escrevia e assinava editoriais que eram verdadeiras lições de teoria avançada de técnicas comerciais. De tal modo as suas orientações escritas para os comerciantes melhor saberem comercializar os seus produtos, eram avançadas para a época, que podemos afirmar que Fernando Pessoa terá sido, a nível mundial, um precursor, pioneiro naquilo que viriam a ser, muito mais tarde, alguns dos postulados das Técnicas e Ciências de Marketing.

Como poeta, desdobrou-se em diversas “Pessoas” conhecidas como heterónimos, em torno das quais se desenvolvem e aprofundam grande parte dos estudos sobre sua vida e sua obra. Centro irradiador da heteronímia, auto-denominou-se um "drama em gente".

Será difícil poder afirmar-se que existe uma biografia completa de Fernando Pessoa, já que, em boa verdade e  em bom rigor, esta deveria ser uma correlação de biografias. Uma, dele próprio; outras tantas, para seus heterónimos Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Ricardo Reis, Bernardo Soares, só para falar em alguns destes heterónimos mais conhecidos. Que não são pseudónimos, com alguns pensam, mas escritores com personalidades e estilos próprios, com vida e história independentes dos demais.

A genialidade de Pessoa era tamanha que não cabia em um só homem; eram necessários vários homens, várias cabeças, para dar vazão a tanta criatividade, ao manancial de ideias que o acometia. Grande conhecedor da língua portuguesa, talvez o sobrenome “Pessoas” fosse mais adequado, para um poeta que era habitado por tantos outros.

Em 1905, parte sozinho para Lisboa onde pretende inscrever-se no Curso Superior de Letras. Embora tenha ingressado nesse curso, jamais o terminou. A partir de 1912 (ano em que nasce Ricardo Reis em sua cabeça), Pessoa entra numa fase bastante produtiva colaborando com a revista Águia, onde publica uma série de artigos e poemas.

Fernando Pessoa era possuidor de uma vastíssima cultura geral e a sua insaciável curiosidade intelectual levou-o a ler e a estudar os mais variados campos. Dava importância a tudo, desde Letras, Artes e Ciências e a sua biblioteca pessoal tinha de tudo um pouco em várias línguas.

A sua obra, em muitos documentos e escritos seus, que constituíram o célebre legado da “Arca de Fernando Pessoa” - acervo ainda não está totalmente esgotado em termos de estudo -  reflecte esses muitos continentes do vasto universo cultural de Pessoa.

Interessou-se tanto pelo profano como quanto pelo sagrado. Embrenhou-se em áreas de espiritualismo e de hermetismo. Estudou a fundo o esoterismo e dizia-se iniciado em Altos Graus Maçónicos, por via estrangeira, pois nunca chegou a ser iniciado na Maçonaria Portuguesa, como desejava.  Foi, isso sim, iniciado como Rosa Cruz, conforme prova o documento certificado que eu próprio examinei numa pesquisa que fiz dos seus documentos na Biblioteca Nacional de Lisboa.

Esteve sempre muito empenhado nos estudos das chamadas ciências ocultas, o que pode ser percebido em muitos de seus poemas. Estudou a Kabala e dominava a simbólica da numerologia e da astrologia.

É célebre a famosa carta aberta que em 1935, pouco antes de falecer, escreveu a favor da Maçonaria Portuguesa (não sendo seu membro) erguendo-se veemente e corajosamente em protesto, e demonstrando grande erudição e conhecimento maçónico, contra a proposta de Lei que um deputado do Estado Novo, a quem invectivou, se preparava para fazer aprovar, decretando a proibição das então designadas “Sociedades Secretas”, Lei que veio a ser promulgada, mas que visava objectivamente a extinção do Grande Oriente Lusitano-Maçonaria Portuguesa, que combatia a ditadura Salazarista.




Em 1930 inicia uma troca de correspondência com o então célebre "mago" inglês Aleister Crowley que neste mesmo ano vai a Lisboa visitar Fernando Pessoa. Vinte e três dias depois de sua chegada, Crowley desaparece misteriosamente, depois de um estranho simulacro de suicídio, no mar da Boca do Inferno, em Cascais. Crowley e sua jovem e bela amante que o acompanhou a Lisboa, haviam encenado mais uma rocambolesca  aventura para impressionar a sociedade da época e sairam secretamente de Portugal, deixanndo por um tempo, a convicção do suicídio de Crowley. Em homenagem ao inglês, Pessoa traduziu e publicou o poema "Hino a Pã" escrito por Crowley.

Fernando Pessoa nunca se casou. Teve por algum tempo um namoro platónico com Ophélia, mas acabou por desistir do namoro para se casar com a literatura. 

Embora tenha escrito e publicado dezenas de artigos, ensaios e poemas em seus anos de vida, por incrível que pareça, ele que é um dos maiores poetas da língua portuguesa, publicou apenas um livro em vida, - Mensagem -  em 1934. Com este livro participou no concurso literário "Antero de Quental" e ganhou o segundo premio, cabendo o primeiro premio ao livro "Romaria" de Vasco Reis. 

Em Janeiro de 1935 pensa em mudar-se para as cercanias de Lisboa, para compor o seu primeiro grande livro a ser publicado, o que não aconteceria.


Em 29 de Novembro de 1935, Fernando Pessoa é hospitalizado. No dia seguinte, 30 de Novembro de 1935, falece de cirrose hepática com apenas 47 anos de vida. Pensa-se que a última frase que escreveu, terá sido escrita em Inglês: "I know not what tomorrow will bring… " ("Não sei o que o amanhã trará").



Carlos Morais dos Santos
Cônsul do M.I. Poetas Del Mundo
Escritor, ensaísta, poeta, fotógrafo





 ********
                Alguns poemas ou fragmentos 
               de poemas de Fernando Pessoa


Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlaçemos as mãos).

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para o pé do Fado,
Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente.
E sem desassossegos grandes.




Prefiro rosas, meu amor, à pátria,
E antes magnólias amo
Que a glória e a virtude.

Logo que a vida me não canse, deixo
Que a vida por mim passe
Logo que eu fique o mesmo.

Que importa àquele a quem já nada importa
Que um perca e outro vença,
Se a aurora raia sempre,

Se cada ano com a Primavera
As folhas aparecem
E com o Outono cessam?
E o resto, as outras coisas que os humanos
Acrescentam à vida,
Que me aumentam na alma?
 

Nada, salvo o desejo de indiferença
E a confiança mole
Na hora fugitiva.




Quer pouco, terás tudo.
Quer nada: serás livre.
O mesmo amor que tenham
Por nós, quer-nos, oprime-nos.




Nunca a alheia vontade, inda que grata,
Cumpras por própria. Manda no que fazes,
Nem de ti mesmo servo.
Niguém te dá quem és. Nada te mude.
Teu íntimo destino involuntário
Cumpre alto. Sê teu filho.




Sim, sei bem
Que nunca serei alguém.
Sei de sobra
Que nunca terei uma obra.
Sei, enfim,
Que nunca saberei de mim.
Sim, mas agora,
Enquanto dura esta hora,
Este luar, estes ramos,
Esta paz em que estamos,
Deixem-me crer
O que nunca poderei ser.




Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.




Não tenho ambições nem desejos.
ser poeta não é uma ambição minha.
É a minha maneira de estar sozinho.
...
Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz
E corre um silêncio pela erva fora.
...
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe porque ama, nem sabe o que é amar...
...
Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver do Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer,
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho da minha altura...
...
A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.




Acordo de noite subitamente.
E o meu relógio ocupa a noite toda.
Não sinto a Natureza lá fora,
O meu quarto é uma coisa escura com paredes vagamente brancas.
Lá fora há um sossego como se nada existisse.
Só o relógio prossegue o seu ruído.
E esta pequena coisa de engrenagens que está em cima da minha mesa
Abafa toda a existência da terra e do céu...
Quase que me perco a pensar o que isto significa,
Mas estaco, e sinto-me sorrir na noite com os cantos da boca,
Porque a única coisa que o meu relógio simboliza ou significa
É a curiosa sensação de encher a noite enorme
Com a sua pequenez...




E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.




Sem a loucura que é o homem
Mais que a besta sadia,
Cadáver adiado que procria?




Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
...
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!




Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.




Triste de quem vive em casa,
Contente com o seu lar,
Sem que um sonho, no erguer de asa,
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar!

Triste de quem é feliz!
Vive porque a vida dura.
Nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raiz-
Ter por vida a sepultura.
...
Grécia, Roma, Cristandade,
Europa - os quatro se vão
Para onde vai toda idade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu D. Sebastião?




Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.

Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que não se cansar?

Minha alma procura-me
Mas eu ando a monte,
Oxalá que ela
Nunca me encontre.

Ser um é cadeia,
Ser eu é não ser.
Viverei fugindo
Mas vivo a valer.




Custa tanto saber o que se sente quando reparamos em nós!... Mesmo viver sabe a custar tanto quando se dá por isso... Falai, portanto, sem reparardes que existis...
...
Quem pudesse gritar para despertarmos! Estou a ouvir-me gritar dentro de mim, mas já não sei o caminho da minha vontade para a minha garganta.




O mistério do mundo,
O íntimo, horroroso, desolado,
Verdadeiro mistério da existência,
Consiste em haver esse mistério.
...
Não é a dor de já não poder crer
Que m’oprime, nem a de não saber,
Mas apenas completamente o horror
De ter visto o mistério frente a frente,
De tê-lo visto e compreendido em toda
A sua infinidade de mistério.
...
Quanto mais fundamente penso, mais
Profundamente me descompreendo.
O saber é a inconsciência de ignorar...
 

Só a inocência e a ignorância são
Felizes, mas não o sabem. São-no ou não?
Que é ser sem o saber? Ser, como a pedra,
Um lugar, nada mais.
...
Quanto mais claro
Vejo em mim, mais escuro é o que vejo.
Quanto mais compreendo
Menos me sinto compreendido. Ó horror
paradoxal deste pensar...
...
Alegres camponesas, raparigas alegres e ditosas,
Como me amarga n’alma essa alegria!




Põe a tua mão
Sobre o meu cabelo...
Tudo é ilusão.
Sonhar é sabê-lo.




Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso! Ó céu!
Ó campo! Ó canção! A ciência

Pesa tanto e a vida é tão breve!
Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai!




Tudo o que faço ou medito
Fica sempre na metade.
Querendo, quero o infinito.
Fazendo, nada é verdade.

Que nojo de mim me fica
Ao olhar para o que faço!
Minha alma é lúcida e rica,
E eu sou um mar de sargaço.




Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.




Foi um momento
O em que pousaste
Sobre o meu braço
Num movimento
Mais de cansaço
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não?
...
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.




Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa...

Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto é melhor, quanto há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
 

O mais que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca...




Bom é que não esqueçais
Que o que dá ao amor rara qualidade
É a sua timidez envergonhada
Entregai-vos ao travo doce das delicias
Que filhas são dos seus tormentos
Porém, não busqueis poder no amor
Que só quem da sua lei se sente escravo
Pode considerar-se realmente livre




Bendito seja eu por tudo o que não sei
gozo tudo isso como quem sabe que há o sol




Que estúpido se não sabe que a infelicidade dos outros é dele
e não se cura de fora.
Porque sofrer não é ter falta de tinta
ou o caixote não ter aros de ferro!
 
*****************

OUÇAMOS ALGUMS POEMAS 


PELAS INTERPRETAÇÕES MAGISTRAIS DE DOIS


GRANTES ARTISTAS LUSÓFONOS


CANTORA MARIA BETHÂNIA  - Brasil

ACTOR MÁRIO VIEGAS (+) - Portugal




 



 



quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

POETISA LÚCIA HELENA PEREIRA DE RN-BRASIL - TRIBUTO DE HOMENAGEM


CICLO TRIBUTO
AOS POETAS LUSÓFONOS

LÚCIA HELENA PEREIRA
Natal,RN - Brasil
Poetisa das Flores




Este nosso Blog – Revista Culturas e Afetos Lusófonos “estende a sua capa” (como fazem os estudantes  da Universidade de Coimbra, numa antiga tradição para que pelas suas capas, estendidas no chão, passem os ilustres), para celebrar neste “Ciclo Tributo aos Poetas Lusófonos", a nossa Homenagem à poetisa Potiguar Lúcia Helena Pereira, de quem começamos  por fazer uma brevíssima síntese de apresentação.
·     Escritora, historiadora, poeta e divulgadora  Cultural;
·         Membro da Academia Feminina de Letrasdo RN;
·        Membro do Instituto Histórico e Geográfico do RN;
·       Primeira presidente regional (RN) e nacional da AJEB; (Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil);
         Membro da UBE – União Brasileira de Escritores;
·        Presidente da casa do Poeta Brasileiro, em Natal;
·         Cônsul (Ceará Mirim) do Mov. Intern. Poetas Del Mundo.

Na poesia de Lúcia Helena Pereira, percebemos a alma de uma poetisa de grande sensibilidade lírica, que se espraia em ondas de emoções e sentimentos à flor da pele. Por vezes, o seu romantismo remete-nos para a tradição dos sonetos muito apreciados na lírica romântica  do século vinte, na linha de um romantismo que não desiste de cantar o amor bem explícito e confesso, esse amor que, sendo eterno, não pode ser esquecido pela poesia, como o relembrava magistralmente a grande porta-bandeira do romantismo português, Florbela Espanca.















Como Florbela, Lúcia Helena ousa levantar seu estro amoroso, sem medo de afrontar aqueles que, incapazes de confessarem o seu íntimo sentimentalismo, vão secando a lírica poética,  calando  a voz do coração, alinhando em mal copiados pós-modernismos de  jogos exdrúxulos de palavras hiperbólicas, metaforicamente exagerados e, muitas vezes, vazios de consistência de ideias e emoções, longínquos do papel da poesia, só para estarem nos modismos, mas estilísticamente sem a genuína beleza que só os grandes poetas percussores teem o gênio de conseguir.
 

Na verdade, hoje em dia, prolifera uma certa poesia pretensamente pós-modernista, que fazendo uso de linguagem estranha e indecifrável, fechada, às vezes sem nexo, outras vezes hiper-minimalista, ignora que a poesia tem de chegar ao coração e às mentes dos leitores, identificar-se com a alma humana nas suas fragilidades e nas suas grandezas, tocar quer na superfície das suas emoções, quer nas profundezas das suas almas, sensibilizar-nos no que é eterno e belo, como o amor, ou  mesmo no que é  transitório e quotidiano, mas nestes casos deve, ou engajar cívicamente  a poesia, ou atrair com as suas líricas jocosas, ou  empolgar e fazer sonhar com o anúncio do futuro, iluminando-o.

Se a poesia não conseguir iluminar o coração dos leitores, tocando-os com alegria, tristeza, nostalgia, arrependimento, amor, ternura, revolta, reflexão, humor,  brejeirice , ou com expressão visionária, então é porque se perdeu, vagueia no escuro e não encontrou o seu próprio e natural caminho lustral.
















Mas a poetisa Lúcia Helena, como digna Cônsul dos Poetas Del Mundo, ergue com frequência o seu estro poético, tanto para cantar o amor e os afetos, como para clamar pela defesa da mãe natureza, levantando o poema à condição de versos cívicos que reclamam contra as ofensas e agressões às belezas naturais. E não esquece as flores, as rosas, os símbolos da amizade, dos afetos, enfeitando os seus versos de nostalgias “da infância distante”, correndo pelas paisagens bucólicas dos canaviais, plantando os seus poemas nesse jardim lírico onde mora a poesia de Lúcia Helena Pereira, A Poetisa das Flores.

Deixamos aqui, para saboreio e apreço dos nossos leitores, algumas peças do canto poético de Lúcia Helena.



LAMENTOS DA MÃE NATUREZA
Rumores. Sons. Burburinhos.
Assim vou ouvindo a natureza em seus gemidos, lamentos, apelos, quando anoitece e a imensidão das matas anuncia suas dores.

Mais adiante, andando pelas altas clareiras, sentindo o cheiro da vegetação, vejo, uma árvore secular chorando sua dor! A dor ferida da navalha, da serradeira elétrica... No horizonte, pássaros atordoados fogem dos seus ninhos. O homem - predador incurável vai devastando a natureza.

Lembro-me, então, da infância distante. Eu, menina de um vale verde, exuberante e esmeraldino, correndo pelos canaviais; engenhos e plantações de cana-de-açúcar. Um mundo livre e belo, sem os artifícios do progresso; com os carros de bois gemendo na estrada e os  vaga - lumes piscando, indicando caminhos; os olheiros com suas águas misteriosas guardando em seu húmus tão viçoso, plantas perfumadas, deixando submergirem, belos nenúfares.

Oh! Homens deixai a natureza em paz!

Não mutilai as árvores. Não deixeis que a poluição mate a vida dos rios, dos peixes.
Contemplai a quietude dos lagos!

OH! Mãe – Natureza, não chore!


EU VI UMA CRIANÇA SORRIR


Era tão linda, parecia um anjo!
Brincava numa calçada feita de lã de ovelha cigana
E tinha nos pés, calejados de pular de corda,
A cor do sangue e do peso de sua liberdade.

Eu vi uma criança sorrir,
Um sorriso cheio de amoras, sorvetes e balas,
Cheirando aos recintos de cinemas
Daqueles filmes infantis maravilhosos
Nos shoppings dos grandes centros urbanos!

Essa criança - como numa ilusão de ótica -
Espiava pela vitrine d´ uma grande loja,
Observando os brinquedos de que mais gostava
E ninguém nem sabia que ela chorava...

Eu vi uma criança sorrir,
Sorriso com aparelho nos dentes
Estava vestidinha de cor-de-ouro e rosa,
Duma marca bem cara...e bonita.

Essa criança de repente subiu num palco,
Fechou os olhos, cantarolou, rodopiou,
Fez tantos malabarismos que o dono do circo,
Apavorado com a proximidade da hora do espetáculo,
Pegou uma vassoura e alçou uma varredura
Naquela criança brincalhona - criança do desamor!

Eu vi uma criança sorrir,
De repente, ao ver um menininho comer uma manga verde,
E sem compreender, ela chorou...
E suas lágrimas, sulcadas n´alma
Do menino faminto, tornaram-se a grande cascata
Correndo pelos rios da infância perdida!

AH!AH!AH! Eu quero sorrir, comer, brincar,
Assistir filmes numa tv bonita, conhecer a Disney,
Jogar nos games da vida, nos plays stations,
Comer um sanduíche gostoso, um bom suco gelado...

Não quero lágrimas dentro de mim,
Não sou palhaço, sou uma criança grande,
Que esqueceu os seus brinquedos,
Numa esquina iluminada, onde o sol brilha em ouro
E as estrelas desenham sonhos de luz!

Eu vi uma criança sorrir...
Era o sorriso nervoso, insano, amedrontado,
De quem não mais tem lágrimas,
E o riso faz a festa da sua dor,
A dor do desdém, do descaso, do abandono...

Deus! Eu quero os sorrisos das crianças,
Compartilhar alegrias, bem-estar, saúde, educação...
Quero uma criança do tamanho do meu país,
Sem ruas tortas e escuras, sem bandidos...
Onde sobram migalhas do banquete de esperanças orfãs.



SÚPLICA

Vem, amor, com esses olhos de anjo,
Nessa urgência louca de amar!
Traz o teu sorriso de arcanjo
E esse cheiro de mar!

Vem rasgar ilusões antigas
No limo de esperas quietas
Para os versos e cantigas
Do som mavioso de tuas cantatas!
Vem, como flores se abrindo,
Dos botões de sonhos que plantei,
Num jardim florido e lindo!

Vem, no cansaço dessas palavras,
No murmúrio róseo dos lábios que pintei
E nos raios de luas adormecidas.




POESIA

Busquei - te entre as flores campestres
E encontrei - te bailando sobre as ondas do mar!

Chamei - te em minha madrugada fria
E chegaste linda, junto com o dourado do sol.

Gritei para que jamais me deixasses
E estavas ao meu lado, como uma rosa viva!

Cantei louvores ao céu, à terra, ao mar,
E eram teus versos que eu interpretava.

Ouvi uma criança chorar profundamente
Mas era a minha menina crescendo...

Olhei para o alto e vi milhões de pássaros,
Num cortejo festivo anunciando alegrias!

Andava sem destino e uma sombra acompanhou - me
Era a asa do Anjo do Senhor amparando - me!

Olhei para o alto e vi a linda face de Deus
Essa face luminosa e iluminada, era a POESIA!



DIVAGAÇÕES




Fico varando noite adentro
Inventando poesias e sonhando sonhos
Assistindo o poente, no alto do morro,
Onde pássaros bebem o licor do orvalho,
Nos cálices das flores
E vão se unindo na cortina de veludo,
Da paisagem úmida da terra.
Sou a menina de um vale verde
Perdida na cidade progressista e barulhenta,
Sem canaviais ondulantes,
Sem o olor do mel exalando
Dos bueiros dos engenhos.
Sem os olheiros,
Com suas águas escuras e misteriosas,
Espelhando meu rosto de criança!
Sou uma mulher cheia de sensações
De poesias molhadas em emoções azuis,
Onde tudo se mistifica e multiplica
Transbordando beleza, palavras, amores...
Afinal, dizem que sou poeta,
Poeta...poesia...poema!!!

DOCE LAMENTO

Peço-te a primeira estrela que desponta
Nos cristais de luz do peito das auroras
Vestidas do sol que aponta
No horizonte incendiado de abóboras!
Espero-te numa tarde de primavera
Para ouvirmos o silêncio das florestas distantes
E contemplarmos aquela solitária palmeira
Embelezando caminhos verdejantes!
Enche meu céu com todas as aquarelas
Colorindo minhas paisagens íntimas
Com tonalidades azuis, violetas e amarelas!
E ouve o doce lamento
Das minhas esperas tecidas de lágrimas
Caídas, liricamente, do meu desalento!

 

PRECISO DO AZUL OCEÂNICO DO SEU OLHAR
Preciso do azul oceânico desse seu olhar
Derramando-se de ondas espumantes
E requebrando-se numa esquina de alto-mar!

Preciso da alegria desse seu olhar,
Cheio de vida e luz,
Feitiço e fuxico enamorando-se!

Preciso da alma desse seu olhar,
Auréola branca de algodão,
Arrecifes distantes, abismos dentro de mim!

Preciso do misticismo desse seu olhar
Impregnado de segredos e mistérios,
De encantos, delírios e maravilhas.


Preciso desse seu olhar dengoso,
Ao mesmo tempo irônico
Zombando dos meus queixumes.

Preciso do sol desse seu olhar iluminado,
Ouro reluzente, pepita luminosa
Tesouro dos meus anseios.

Preciso desse seu olhar bondoso,
Sem piedade, só prontificado,
A proteger-me e amar-me.

Preciso do fogo desse seu olhar de brasa
Queimando todos os meus segredos
E ensinando-me a ser presente,
Na festa odorífica de um orgasmo.


TRAGO UMA FLOR DENTRO DE MIM










CHEIA DE CHEIROS E RICO ESPÉCIME,
COM PÉTALAS DOURADAS,
ÀS VEZES AVELUDADAS.

TRAGO UMA FLOR DENTRO DE MIM
COMO SE FOSSE UM PEQUENINO JARDIM
ENFEITANDO O MEU ALTAR INTERIOR.

TÃO PERFUMADA E TERNA,
COM MIL NUANÇAS
AO BALOIÇO DO VENTO...

TRAGO UMA FLOR DENTRO DE MIM,
QUE CHORA AO SENTIR SEDE,
E SE ACALMA QUANDO A NOITE CHEGA...

ESSA FLOR ÀS VEZES FICA ESQUECIDA,
NUM CANTO QUALQUER DO JARDIM FLORAL..
E SE DESTACA, PELA BELEZA E COR!

TRAGO ESSA FLOR COMIGO HÁ MUITOS ANOS,
IMORTAL, VIVA E RESPLENDENTE -
A FLOR DA AMIZADE E SOLIDARIEDADE.


O OURO DO SEU OLHAR

Ouço singela canção na melodia do seu olhar.
Notas musicais vão chegando,
Como flores amanhecidas
Despetalando-se do roseiral de sua alma!

Genuflexa, faço uma súplica de amor,
A alegoria brilhante dos seus lábios
Bordam luminosos contornos
Passeando diante de mim!

E vou colhendo, orvalhada e doce,
Uma maçã rosada,
Como se fosse da cor do seio da menina-moça,
Refletida no ouro límpido do seu olhar.
Olhar de sol, fogo, labareda intensa,
Vulcão de inebriante paixão!

O ouro cintilante do seu olhar me acende,
Tal crepitante fogueira - fagulhas no ar -
Queimando os meus desejos todos
E transformando em cinzas, os meus anseios amarelos.

Quero essa estrela fulgurante
Iluminando o firmamento do seu olhar,
Onde brilham brancos e adornados sonhos,
Como pérolas cortejando solitários pensamentos,
Como anjos protegendo ricos sentimentos,
No ouro reluzente do seu olhar mestiço,
Cheio de sal, céu e luz!


QUE A LIRA DE LÚCIA HELENA CONTINUE TANGENDO SEUS CANTOS POÉTICOS, ECO PROFUNDO DAS LONQÍNQUAS VOZES SEMPRE EMBALADAS PELO INABALÁVEL ENAMORAMENTO QUE NÃO TEM TEMPO, NEM LUGAR, NEM MEDIDA, PORQUE É SEMPRE CONSTANTE,  EMOCIONAL E IMORREDOIRO.





Textos de apresentação, comentários e fotos
de Carlos Morais dos Santos
Cônsul (Lisboa) do M.I.Poetas Del Mundo
Editor-Administrador do Blog-Revista C.A.L.