Com a devida vénia, transcrevemos aqui trecho do artigo de Irene do Amaral sob o título empígrafe:
"O conceito de luso-brasilidade
representa um desafio cultural envolto em dificuldades que advêm de uma
relação colonial constantemente relembrada de forma direta ou indireta,
quer pelo Brasil quer por Portugal. Porém, a produtividade subjacente ao
diálogo luso-brasileiro sempre se sobrepõe; porquanto o reconhecimento
dessa relação resulta do aprofundar da compreensão das identidades
portuguesa e brasileira, a par do entendimento do espaço cultural
transatlântico.
Também é verdade que esse
diálogo pós-colonial ressurge ao longo do século XX enquanto proposta
das elites culturais e políticas. Os interesses que lhe deram forma
foram, pois, assumindo diferentes vocações, ao sabor de ideologias
nacionalistas ou solidárias, de valor afetivo ou puramente estratégico.
No fundo, o que está em causa é a afirmação identitária consciente de
uma especificidade transatlântica a dizer em português.
As bases do refazer do diálogo
luso-brasileiro podem então constituir-se através do processo de
resolução de um passado traumático de natureza colonial contíguo a uma
longa diáspora lusa no Brasil. Aliás, essa experiência migratória dará
origem ao movimento inverso, o do regresso do chamado "brasileiro"ou
"torna-viagem." Na tradição literária portuguesa dos últimos dois
séculos, o torna-viagem do Brasil - à semelhança do da América do Norte -
foi adquirindo um estatuto ambíguo, sendo identificado ora como
brasileiro, ora como português.
Na verdade, as relações entre os
Açores e o Brasil foram sedimentando ao longo de séculos e as redes
sociais da emigração continuaram pelo século XIX e primeira metade do
século XX a alimentar a renovação humana e cultural de um diálogo entre
Portugal e o Brasil intermediado pelas ilhas açorianas.
Os trabalhos brasileiros do académico açoriano Vitorino Nemésio
dão conta da sua atenção àquele esforço transatlântico. Isto é, o
roteiro brasileiro acompanha o autor ao nível da sua produção poética e
ensaística, sem que nos esqueçamos do contributo do professor de
Humanidades no Brasil e em Portugal ou o do comunicador ao nível dos
media. Pela qualidade académica e sentida do seu discurso, Vitorino
Nemésio afirma-se como uma voz credível do diálogo luso-brasileiro,
constituindo a sua escrita um dos lugares privilegiados para se observar
as relações culturais entre Portugal e o Brasil."
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