Cena de "Turismo Infinito", de Ricardo Paes, baseado em Fernando Pessoa
"Sombras", o novo espetáculo de Ricardo Pais
para o Teatro Nacional São João, do Porto, Portugal, estreia naquela
cidade no dia 18 e será umas das atrações internacionais da temporada
paulista de 2011.
Com variações no elenco, teremos
o mesmo talentoso encenador e a companhia que trouxeram, no ano
passado, "Turismo Infinito", baseado em Fernando Pessoa. Intercâmbio artístico que se segue à montagem de Madame, de Maria Velho da Costa, que reunia Maria Eduarda, de Os Maias, de Eça de Queiróz e Capitu, de Dom Casmurro, de Machado de Assis. Estas mulheres inquietas foram interpretadas por Eva Wilma e Eunice Muñoz.
Em "Sombras", Pais continua a
repensar teatralmente as imagens, reais ou inventadas, em torno da nação
portuguesa ao longo do tempo. O ponto de partida é um verso do seu
compatriota, o poeta Alexandre O"Neill (1924-86): "Portugal, questão que tenho comigo mesmo." Potências literárias - do quinhentista António Ferreira, o dramaturgo da tragédia A Castro, a Almeida Garrett, Fernando Pessoa
e poetas contemporâneos - formam o texto. Na composição plástica e
sonora desse universo múltiplo entram dança e vídeo, fado e fandango.
Há uma afetuosa relação prévia
de "Sombras" conosco. Ricardo Pais evoca a passagem anterior por aqui:
"Quando há um ano estivemos no Brasil com Turismo Infinito, me
perguntaram por que é que nós não fazíamos um espectáculo de fado "a
sério". Ao que respondi: Mas já fizemos várias coisas de fado a sério.
Seja como for, a proposta dos nossos amigos brasileiros aconteceu porque
a identificação do público de São Paulo com Turismo Infinito e com o
Fernando Pessoa foi fascinante. E boa parte do fascínio decorreu do
facto de as pessoas ouvirem portugueses a dizer Pessoa."
Assim nasceu "Sombras": a
proposta de Pais e seus companheiros de "fazermos algo que
correspondesse, na medida do possível, à encomenda brasileira: uma
incursão no território da nossa língua, aí incluindo o fado. Ocorreu-me
que seria interessante brincar um pouco com nossas histórias, nosso
próprio sistema de lendas, a mitologia de D. Sebastião, etc."
Contrapondo-se ao viés trágico
que se atribui ao fado, a representação traz à cena outro gênero, o
fandango, que o diretor define como uma cavalgada eufórica. "Sombras" foge
ao realismo documental e à exaltação passadista em favor da exposição
poética dos contrastes de Portugal.
O tom é de evocação histórica,
ecos dramáticos extraídos da ficção, poemas e fragmentos de prosa. A
linha emocional da ação junta tempo, fado, figuras nobres e plebeias; e,
como acentua o director, expõe "a timidez em enfrentar o nosso próprio
retrato, ou a pressa de perdoar, de aplacar; e ainda a vida lisboeta nos
escassos mas vibrantes textos populares de Pessoa; a vertigem da culpa e
do desejo nos poemas de Pedro Homem de Mello" (autor da letra do fado Povo que Lavas no Rio, consagrado por Amália Rodrigues e recriado por Dulce Pontes)
O subtítulo da encenação - "A
nossa tristeza é uma imensa alegria" - simboliza a recusa em enquadrar
uma imagem nacional no lamento e na eterna perda. Na sua concepção, por
mais que se fale do fado como rito de sofrimentos, o importante é a
vitalidade com que se canta. Cantar para que o dia nasça e afaste as
trevas.
No Brasil. Na companhia de Mário Laginha,
um músico inovador entre o jazz e suas raízes, atores, cantores
fadistas e bailarinos, todos de alto nível, o Teatro Nacional São João
estará, em junho e julho de 2011, em São Paulo, Santos e Belo Horizonte
(locais a serem definidos) com a subtileza de Sombras que, segundo Pais,
exalta os jogos de equívocos e verdades de que o teatro é capaz e nunca
parece saciar-se.
QUEM É RICARDO PAIS
O encenador português, nascido
em Maceira, em 1945, é um criador audacioso, dos melhores de sua
geração. Estudou no Drama Centre London e trabalhou com Victor Garcia, o revolucionário encenador argentino.
Nenhum comentário:
Postar um comentário