Portugal comemorou há apenas 10 dias, a Revolução de 25 de Abril de 1974 - A esperançosa Revolução dos cravos que assinala o seu regresso à democracia e ao desenvolvimento mas, 37 anos depois, acaba de "celebrar", ontem, a imposição de um severo e punitivo programa de governo, imposto por entidades externas, uma designada Troyka, composta de Altos Funcionários Especialistas do Banco Central Europeu, da Comissão Europeia e do FMI - Fundo Monetário Internacional, para "salvar" Portugal da "banca-rota"
Décadas de desgovernação, incompetência e muita corrupção, levaram Portugal a acumular uma monstruosa dívida pública e privada que, agora, vai ter de ser paga, com juros especulativos, a duras penas, pelo povo trabalhador, incluindo mesmo os que já haviam adquirido o direito à suas aposentadorias, todos vergados ao peso de violentos aumentos de impostos e redução de serviços sociais, apesar de, desde 1986, data da adesão de Portugal á União Europeia (então designada C.E.E.), Portugal ter recebido colossais verbas de auxílio para que promovesse o seu Desenvolvimento Económico e Social, em termos de atingir uma coesão ao nível da média dos países desenvolvidos da UE.
Esta é uma situação vergonhosa e humilhante, que está provocando um alto nível de desemprego, sobretudo nos jovens, apesar de, em grande parte, estes se terem qualificado com formação universitária superior, mas que se vêm agora "obrigados" a reabrir novamente o indesejado e estigmatizante movimento emigratório para outros países. A classe média está a diminuir, contribuindo para aumentar o nível de pobreza que seria expectável já tivesse, entretanto, sido irradicada.
Apesar do enorme desenvolvimento em modernização de infra-estruras (estradas, saneamento, telecomunicações, saúde, educação, ciência e tecnologia, etc.) que Portugal desenvolveu, apresentando hoje um perfil de país moderno, a economia portuguesa não tem crescido a um ritmo que alimente os custos dessa modernização, em grande parte porque o setor empresarial mais importante como motor de uma economia sustentada - as PMEs - não foram, durante muito tempo, estratégicamente apoiadas, quando se sabe que reside nas PMEs de qualquer economia moderna a mais dinâmica capacidade de criação de riqueza e de emprego. Ao invés, foi-se favorecendo os grandes grupos empresariais nacionais e multinacionais, sobretudo o setor financeiro, que beneficia de proteções e isenções fiscais absolutamente escandalosas, não tendo a produção de bens transacionáveis, que são mais criadores de riqueza e de potencial exportador, sido apoiada, a não ser nos casos de grandes empresas, corporações ou oligopólios.
Por outro lado, no plano político-económico, o desvario de sangramento dos recursos financeiros dirigidos para um despesismo acima das próprias receitas, para empanturrar as clientelas partidárias e favorecer a multiplicação rápida de novas fortunas ilegítimas dos "afilhados" dos partidos (muitos ex-políticos, deputados, ministros, autarcas, altos funcionários partidários, etc.) que se vão banqueteando nos absurdamente numerosos "Conselhos de Administração", com altíssimos e obscenos salários e prémios, além de mordomias inadmissíveis, mesmo quando essas empresas públicas apresentam prejuízos crónicos.
Esta miopia imoral, vem alimentando uma imensa classe de parasitas gananciosos, em muitos casos sem serem possuidores de qualificações profissionais e, esta ciranda das alternâncias da desgovernação, que três partidos vão partilhando, levou à criação de numerosas e desnecessárias empresas públicas, Fundações, Institutos, nacionais, regionais e autárquicos, cujas funções ou são puras inutilidades, ou são meras duplicações de serviços que tradicionalmente, antes, sempre couberam serem exercidos pelos serviços públicos dos ministérios onde abundam técnicos competentes e experientes.
A política e o próprio estado foram apropriados pelos altos interesses financeiros nacionais e, principalmente, multinacionais, que vão garantindo regalias e boas posições aos políticos, e estes, passaram a servir mais os interesses privados do que os interesses públicos. O exercício da política como nobre serviço a favor da Pólis, foi canibalizado pelos arrivistas da política, para dar lugar aos interesses pessoais e partidários, em que a conquista do poder é o fim que justifica todos os meios para se alcançar os maiores benefícios egoistas.
É neste quadro de dissolução de valores e princípios e de ruina dos ideais que a Revolução de 25 de Abril de 1974 prometia, que cresce a multidão dos humilhados e ofendidos que, após 37 anos, se vêm confrontados com o desemprego e o empobrecimento num Portugal que continua por cumprir.
Este meu poema é, pois, mais um dos meus muitos gritos de revolta, talvez ainda mais sentidos, por eu pertencer a uma geração que tudo sacrificou e arriscou (a liberdade e a vida) para que Abril se cumprisse e, por via dessa revolução romântica, se cumprisse, enfim, Um Novo Portugal, mais justo, mais desenvolvido para todos os portugueses e não apenas para a nova classe de "políticos" de rapina, que desprezam Portugal e os portugueses e envergonham aqueles outros competentes, honestos e nobres políticos que ainda resistem e que, por serem raros, são facilmente "deglutidos" e marginalizados pelas alcateias insaciáveis dos lobos do poder.
Fernando Pessoa, Acrílico de José Manuel Rosa
Fernando Pessoa - Por Almada Negreiros
PESSOAS SEM ABRIL
Já a minha débil pessoa declinando vai
Mas com Pessoa hei-de permanecer
Até ao último sopro, meu derradeiro Ai
Respirarei Pessoa até me desvanecer
Ele me eleva como pessoa, é meu alimento
Dele, como e bebo palavras, essência do SER
Com ele aprendi a sublimar o sofrimento
Que a mediocridade arrogante pode fazer
De meus devaneios, sonhos e vãs esperanças
Do meu acreditar nos homens e sua redenção
Ficaram das decepções amargas lembranças
Por que faliu o humanismo e o triunfo da razão
E se mais Pessoas houvera nele em Pessoa
Para falar de coisas belas e de justos ideais
Mesmo agora que seu génio e estro mais ecoa
Há mais pessoas a se nutrirem de pecados venais
A minha pessoa não se corrompe de indiferença
Enquanto me alimento de Pessoa e bebo da poesia
de Torga, de Natália, de Sofia, e sinto a presença
De Camões, de Régio e de Almada, terei a energia
Se minha pessoa declina, se desvanece e sofre à toa
Porque se esgota a minha esperança, mas não o ideal
De vir a ser verdade a Pátria de Camões e de Pessoa
E de finalmente ser cumprido esse desejado Portugal
Oh meus 38 anos de ditadura mas de viva esperança
Pesam-me agora 36 de medíocre e injusta democracia
Que o adágio que diz que quem espera sempre alcança
Morre na garganta do povo pobre que não viu o Novo Dia
"Oh, sub-alimentados do espírito" clamava Natália, infeliz
"A poesia é para se comer", regada a bom vinho cultural
"Pergunto ao Vento que passa, notícias do meu país",
Canta Alegre. Não se cumpriu Abril nem ainda Portugal
Mas onde está essa pátria amada feita de Fraternidade
Onde a liberdade e a democracia seja mais que formal
Onde o pão da boca e do espírito alimente com equidade
E não empanturre de indigestão os vampiros de Portugal
Oh sedentos de poder, sem SER, gananciosos de capital
Ouçam os poetas e a maioria silenciosa que sofre carências
Oh gananciosos corruptos que desvirtuaram o Abril Ideal
Bebam mais de Pessoa e de outros. Políticos de indecências!
Oh pessoazinhas arrogantes, da baixa política trapaceira
Oh pessoas pequeninas, medíocres, egoístas, sem ideal
Oh profissionais dos partidos de estar na vida matreira
Oh estadistas que só promovem o vosso poder pessoal
Ocupem-se a cumprir Portugal como reclamava Pessoa
Portugal não é pobrezinho, vocês é que são pequenotes
Dos Grandes é que reza a história e, de vocês, de alma vazia,
ficará o clamor do povo, a voz da pátria magoada que ecoa!
Portugal seria bem rico se governassem sem tantos desnortes
Acreditem, senhores, nos poetas patriotas e nas lições de poesia
Pois vossos erros, desgovernos, ganâncias e egoísmos fortes
Serão as pequenezas e vilezas que lembraremos sem nostalgia.
O 25 d`Abril fez-se não para vós mas para o povo de más sortes
A quem ainda não chegaram os cravos de Abril, a flor da alegria
Carlos Morais dos Santos
Cônsul da Soc. Internac. Poetas Del Mundo
Prezado Seareiro: Bem haja! Bem haja também os seus magníficos versos e bem haja a sua abalizada análise, cirurgicamente conduzida, e que retrata fielmente toda a dramática situação por que passa a nossa querida Portugal!
ResponderExcluirA pergunta que não quer calar: Até quando ficarão impunes os sabidos (nos 2 sentidos...) causadores dessa tragédia anunciada?
Pobres jovens que vêm as perspectivas de evolução pessoal e profissional diminuírem cada vez mais, a ponto de serem obrigados a procurar sobrevivência além fronteiras.
Roguemos ao nosso Pai Celestial que conceda a graça de reverter esse caótico quadro econômico-financeiro-estrutural e, portanto, social, repondo no devido e merecido lugar a soberania, no sentido lato da palavra, da querida Pátria Lusitana. Que assim seja!
Muito boa a análise da situação de Portugal, direi, como portuguesa que sou, que, em poucas palavras, você disse tudo, uma análise abrangente mesmo.
ResponderExcluirTambém o poema "grito" vem somar a tudo isso a sensibilidade artística do observador que não é apenas um economista.