Por Eduardo Quive
escritor, jornalista (Escorpião, kuphaluxa, Literatas-Revista de Literatura) - Moçambique
Baladas que levaram Paulina ao vento
escritor, jornalista (Escorpião, kuphaluxa, Literatas-Revista de Literatura) - Moçambique
Baladas que levaram Paulina ao vento

Escritora Paulina Chizane
Paulina Chiziane, é agora uma mulher do mundo, mas esse percurso foi longo e teve um princípio.
Esse princípio
chama-se Balada de Amor ao Vento, uma verdadeira viagem na realidade
moçambicana e caracteristicamente o perfil da Paulina para quem acompanha as
suas obras.
Esta obra
retrata, desde a juventude à idade madura, o cenário em que a Sarnau e o
Mwando, protagonistas desta eloquente estória de amor, percorrem os dias, os
meses, os anos, os encontros e os desencontros, a dolorosa separação, o
desespero, o sofrimento, a alegria, as lágrimas e os sorrisos, numa atmosfera
que nos envolve e, nos comove.
«Tu foste para
mim vida, angústia, pesadelo. Cantei para ti baladas de amor ao vento. Eras
para mim o mar e eu o teu sal. No abismo, não encontrei a tua mão.»
Mas haverá um
reencontro? Serão Sarnau e Mwando capazes de apagar um tão longo e trágico
passado? Existirá ainda para eles um futuro a partilhar?
Voltarás a
conseguir esboçar no rosto o teu lindo sorriso, há muito perdido no tempo?
Abrirás enfim os
braços para neles abrigares o amor? Ouvirás a melodia que o vento espalha no
universo? Texto retirado da contracapa da obra editada em 1990 e reeditada em
2003 pela editora moçambicana, Ndjira.
Na segunda
viagem, a escritora a voar nos “Ventos do Apocalipse”, lançada pela editora
Caminho, em 1999 e reeditada, em 2006.
Guerra,
destruição, miséria, sofrimento, humilhação, ódio, superstição, morte. Este é o
cenário dantesco, boscheano, que encontramos nas páginas deste romance. A
escritora consegue levar-nos ao âmago do mais baixo dos mais baixos degraus de
degradação do ser humano.
Com ela percorremos
as vinte e uma noites de pesadelo e tormentos que foi o êxodo dos sobreviventes
de uma aldeia.
«Se o homem é a
imagem de Deus, então Deus é um refugiado de guerra, magro e com o ventre farto
de fome. Deus tem este nosso aspecto nojento, tem a cor negra da lama e não
toma banho à semelhança de nós outros, condenados da terra. O Diabo, sim, esse
deve ser um janota que segura os freios da vida dos homens que sucumbem.»
Ndjira.
Já “O Sétimo
Juramento”, lançada em quatro edições, concentra-se num fenómeno que é muito
característico nas famílias moçambicanas, mas hoje ainda que de forma oculta.
Feitiços, tabus,
magia negra, fantasia e muito pânico, é a vida que nos é demonstrada por esta
autora, baseando-se numa família de condições médias, e cheia de muitos
problemas, que se supõe que seja obra de feitiçaria.
Nesta obra, o
personagem David, sem se aperceber, entrega-se a magia negra e as tradições
mais antigas das famílias moçambicanas, sobrevivendo do curandeirismo e actos
assustadores para o seu crescimento económico.
Por outro lado o
seu filho enfrenta uma maligna doença que se manifesta de uma maneira estranha,
e assim vai se fazendo esta obra, desvendando estes mistérios que nos levam a
delirar a cada página.
Estas são
algumas ideias trazidas em termos da nossa percepção da qualidade bibliográfica
da Paulina Chiziane, que brindou as mulheres, já em 2002 com seis reedições que
tomaram o mundo.
Por último, nos
trouxe “O Alegre Canto da Perdiz” que exalta, igualmente, a vida de uma mulher
bonita que encanta até homens brancos e “As Andorinhas” que relata a estória de
alguns Heróis Moçambicanos, como Eduardo Mondlane.
Prémios
Em termos de
prémios, Paulina Chiziane, não nos remete a várias viagens, tendo vencido em
2003. o Prémio José Craveirinha, pela obra Niketche: Uma História de Poligamia.
Mas em termos de
acontecimentos mais marcantes na carreira desta escritora, destaca-se a sua
designação, pela União Africana (UA), como embaixadora da paz para África em
Julho de 2010.
Sobre o feminismo da Paulina Chiziane
Muitas vezes tem
se chegado a conclusão de que Paulina Chiziane é feminista, entretanto, em
entrevista com o Kuphaluxa, a escritora não deu importância, simplesmente
escusou-se de assumir ou negar esta postura.
“Estou-me nas
tintas... que o chamem. Eu sou uma mulher e falo de mulheres, então eu sou
feminista? É simplesmente conversa de mulher para mulher, não é para
reivindicar nada, nem exigir direitos disto ou daquilo, porque as mulheres têm
um mundo só delas e é isso que eu escrevi, e espero que isso não traga nenhum
tipo de problemas, porque há ainda pessoas que não estão habituadas e não
conseguem ver as coisas com isenção.”
Na mesma
entrevista, a escritora, falou ainda da sua postura feminina, principalmente,
argumentando o factor mulher no auge das atenções no mundo africano.
“Ser mulher é
muito complicado, e ser escritora é uma ousadia. Como é uma ousadia a mulher
sair de madrugada ir a praia comprar peixe para vir cozinhar. A mulher está
circunscrita num espaço e quando salta essa fronteira sofre represálias, há
quem não as sente de uma forma directa, mas a grande maioria...”
“É sempre uma
dificuldade, porque primeiro, eu tenho de provar que sou capaz, depois tenho de
conquistar um espaço. Eu tenho que trabalhar muito para mostrar que não foi por
acaso que as coisas aconteceram. Mas agora estou numa fase mais estável em que
as pessoas já não se assustam e, de certa maneira, já não implicam; mas para
chegar até este ponto teve de ser uma batalha.” Disse Paulina.
Sobre a escrita
e a literatura moçambicana, a escritora disse que escrever é uma maneira de
estar no mundo. “Eu preciso de meu espaço, é por isso que eu escrevo. Em
primeiro lugar eu escrevo para existir, eu escrevo para mim. Eu existo no mundo
e a minha existência repete-se nas outras pessoas. E neste caso é um livro, que
depois será lido.”
“Acho que está a
ganhar uma dinâmica maior nos últimos anos, há autores que começam a apostar
muito seriamente e apresentam propostas novas. E há novos talentos, tantos, mas
o que falta é uma mão, por exemplo aqui em Quelimane há um movimento muito
grande.”
Verdade ou não,
Paulina Chiziane é um dos símbolos do romancismo literário moçambicano, até
hoje, a única mulher que tem se identificado com este género, mas não
assumindo, como me referi, na introdução deste texto.
“Não sou
romancista, sou apenas contadora de estórias. Estórias longas e curtas,
inspiro-me nos Nkariganas em volta da lareira, que os nossos avós contam-nos.”
Diz sempre a escritora.
Paulina
Chiziane, nasceu no distrito de Manjacaze, porvíncia de Gaza, a 4 de Junho 1955
é uma escritora moçambicana, que apesar de ser identificada como romancista, a
autora nunca assumiu esta identidade do género literário e classifica-se como
uma contadora de estórias longas.
Com as suas aves
formadas nos subúrbios da cidade de Maputo, Paulina, nasceu numa família
protestante onde se falavam as línguas Chope e Ronga. Aprendeu a língua
portuguesa na escola de uma missão católica.
Começou os
estudos de Linguística na Universidade Eduardo Mondlane sem, porém, ter
concluído o curso.
Iniciou a sua
actividade literária em 1984, com contos publicados na imprensa moçambicana,
como, a Revista Tempo e Domingo.

Eu sou uma mulher e falo das mulheres”
Eduardo Quive
Escritor, jornalista (Moçambique)